sábado, 15 de maio de 2010

Dia Santo?!

Que raio de dia Santo este, em que a única bênção à vista é o voo das gaivotas. E a cantiga do Mar. e o sol quando rompe a chuva. Que bom, tudo o que nos eleva e nos distancia da dor.


Que raio de dia Santo este.

Um dia entre luz e sombra. Entre beleza profunda e submersão na porcaria. Dos outros, que ficou para nossa.

Que raio…

Podíamos filosofar sobre de quem é o lixo quando ali fica, esquecido, a pontuar a areia. De quem é a chuva?

De quem é aquele Objecto Marítimo Não Identificado que se soltou de New Jersey há um ano, e que de toda a costa escolheu Melides para vir descansar, enquanto a Protecção Civil ou a Capitania, ou alguém com mais força do que nós, não o vem buscar? E porque é que ele nos escolheu, aos nossos 45km de objectivo 2010, para vir descansar?

De quem é o mar? e a nossa energia, renovada todos os dias perante a fúria e a quase-impotência de uma praia invadida pelo lixo anónimo, de quem é?

É de nós todos. Pertence à Terra, que dá e pede.

Todo este lixo teve uma história, teve um pretexto para existir, um tempo. E a dignidade dessa memória, ficou esquecida em que canto? No das fotos, onde cabe amanhã a do tractor que vem buscar as primeiras duas toneladas de lixo (6 tons em seis dias, senhores, com não mais de 12 pessoas a trabalhar nos dias melhores…).

Ou a foto do grupo que se há de juntar e aumentar no fim de semana… ou só, “só”, a dos quilómetros de praia limpa, de mar solto, de pés descalços completamente despreocupados que vamos deixar como rasto.

Queria que fosse uma semente, esta Brigada. Que nos ficasse no ADN como necessidade de cumprir, pelo menos anualmente. Há coisas que só podemos fazer pelos outros, não podemos esperar que todos os outros façam. E não as fazemos porque os outros fazem, ou porque os outros reparam. Fazemos porque é o nosso papel, a nossa função neste bocadinho de mundo. Nesta amostra de vida. A nossa.

Do nosso respirar exalam forças para os que cá não estão mas gostavam de estar. Estamos com eles e por eles. Exultam forças para os que nos ignoram: por eles trabalharemos mais. Do nosso respirar exalam dias mais limpos em que houve rasto de nós, e alguém os vai repetir.

Sonho com o dia em que um filho meu me pergunte “mãe, o que era o lixo abandonado?”.

Ainda não é aqui, nem agora. Mas vamos a caminho. Quem vem espreitar??

mpc


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1 comentário:

Anabela disse...

Bonitas e sabias palavras...adorei a tua mensagem.
Beijinhos